segunda-feira, 28 de junho de 2010

Amazônia – ninho de águias agroenergéticas



Sabemos do papel que a Amazônia vem assumindo no discurso hegemônico do aquecimento global. Ela é, nada mais, nada menos, que colocada como principal eixo de compensação do CO2 emitido na terra pelos humanos que pretensamente vem causando um aquecimento planetário, sendo este abordado numa perspectiva messiânica e apocalíptica. Deveria ser óbvio, mas a obviedade se manifesta quando a desgraça se estabelece. O Brasil, detentor do maior território amazônico está sendo emparedado num clássico processo de formação de um discurso hegemônico no qual, a continuar no rítmo que vem sendo veiculado, trará a justificativa necessária para uma intervenção dos EUA a partir do consentimento da ONU, provavelmente dentro de uma coalisão com outras potências ávidas por energia[1].

Ora, a primeira Guerra do Golfo se deu em nome da democracia através do ataque em massa de um antigo aliado norte-americano, o Iraque e seu ditador,  que cometeu a loucura de tentar reanexar o Kwait. Num Iraque destruído, a segunda Guerra do Golfo ocorreu em nome da humanidade a partir do massacre de um povo  que não oferecia a menor resistência para nada, quanto mais ameaçar a humanidade com armas de destruição em massa, essas sim, nas mãos das grandes potências. Tudo isso foi mais que aceito midiáticamente. Provavelmente, a covardia da invasão das “tropas de coalisão” (eufemismo para justificar a invasão norte-americana com seus sócios) será num futuro não muito distante encarada como uma das maiores barbáries bélicas da história humana. Muito haverá para se contar do assassínio não divulgado de um gigante militar contra uma nação absolutamente empobrecida.

O hoje satanizado Bush filho foi comemorado numa imensa propaganda de construção da imagem totalmente absurda de que um Iraque empobrecido  possuía armas de destruição em massa. O Iraque estava colocando o Planeta Terra em risco. Hoje isso já parece absurdo. Mas a morte veio a Mach 3 e em massa. Ninguém nos EUA se opôs. No mundo, poucos se atreveram ao menos a discordar. Esse mesmo mundo não se oporia à invasão do Irã que passou a ter a figura do seu presidente eleito banalizada como a de um fanático. Essa banalização só deixou de acontecer quando o Irã permitiu a entrada de empresas petrolíferas russas em troca de proteção militar. Bush chegou a anunciar a terceira guerra mundial. Blefe. Mas blefe porque o adversário era outro. E foi aí que a Casa Branca decidiu admitir, pelo próprio Bush, que os EUA eram viciados em petróleo. É que a guerra se tornara cada vez mais perigosa. O Irã não mais se colocava nas situação de fragilidade do Iraque, ao mesmo tempo em que as perdas dos “aliados” se misturava com o massacre até hoje não dimensionado de iraquianos.  

Pois bem, se os democratas reconhecem a importância do partido republicano como “um partido que teve por base a autoconfiança, a liberdade individual e a unidade nacional” certamente não é por acaso. Aliás vem de longe o anedotário político de que nada é mais republicano do que um democrata. Afinal, o legendário (ao menos para os americanos) John Kennedy, forçado ou não, fez parte da guerra fria e agiu a contento. Enviou e aumentou tanto a presença dos “conselheiros militares” americanos como também a presença bélica efetiva no Vietnã, inclusive com a introdução dos “boinas verdes”. Morreu Kennedy e assumiu o também democrata Lyndon Johnson que, em definitivo, completou a tarefa de entrada velada dos EUA na guerra.

A crise energética mundial colocou os EUA na posição de buscar novas alternativas energéticas. Curiosamente surgiu no discurso do democrata Obama, um inimigo oculto absolutamente novo e incrivelmente amplo: os inimigos do planeta. Democratas, Al Gore, aquecimento global, Barack Obama, inimigos do planeta a serem destruídos. Coincidências demais para um povo acostumado a dizer “Nós somos, e sempre seremos, os Estados Unidos da América”, não como uma afirmativa nacional, mas como crença arraigada do seu poder imperial. Não é o novo presidente americano quem trabalha a perspectiva agroenergética e, provavelmente, a tomada da Amazônia (não apenas a brasileira) assim como não foi Bush nem pai nem filho que criaram a geopolítica do petróleo dos EUA. É parte do pensamento americano, agir para manutenção do império.  E mantê-lo faz com que se ajam em várias frentes.

Enfim, se Bush anunciou a insurgência de uma nova era pela incapacidade de manutenção de um mundo energético baseado como fonte principal no petróleo (e colocando as medidas para tal) Obama tratará de dar continuidade a esse processo só que com maior “poder de fogo” agindo na implementação de uma estratégia de médio e longo prazos, tanto na parte tecnológica e produtiva (o que é continuidade do que já estava previsto no fim do governo Bush) como, o que é o fundamental, no arraigar do emparedamento dos países tropicais do planeta (dos quais o principal deles é o Brasil) através da construção do discurso hegemônico da intocabilidade das suas áreas. Os EUA possuem um ambicioso projeto próprio que lhes dará a sua tão esperada liberdade energética. Para os que possam duvidar disso, eis o resultado no campo do etanol do primeiro encontro entre os presidentes Lula e Obama ocorrido em 14 de março de 2009.

O encontro de sábado também serviu para deixar claro que os EUA não pensam em abrir tão cedo o mercado americano para o etanol produzido no Brasil, uma reivindicação que Lula e os usineiros brasileiros tem feito com insistência. Na entrevista ao lado de Lula, Obama admitiu que as barreiras tarifárias impostas ao álcool importado geram tensão entre os dois países, mas disse que o problema só será solucionado " com o tempo " . Num encontro na sexta-feira em Washington, o secretário de Agricultura dos EUA, Tom Vilsack, disse a representantes da União da Indústria de Cana-de-Açúcar (Unica) que não há a menor possibilidade de eliminar as tarifas do etanol no curto prazo. A legislação em vigor assegura sua manutenção até o fim de 2010 e sua retirada agora poderia aumentar os problemas gerados pela crise econômica para a indústria americana de etanol. (ENCONTRO Lula-Obama reduz chances de Doha, O Globo, Rio de Janeiro,13mar.2009.Disponível.em Acesso em: 25 abr. 2009).


Os EUA possuem um projeto próprio. Não é a crise que objeta a retirada do protecionismo ianque à entrada do etanol brasileiro em seu território. A crise é a justificativa de Obama para a proteção do projeto estatudinense de produção. Afinal eles também detêm a tecnologia, inclusive de cana de açúcar como já dissemos e não irão usar seu mercado para fortalecer um gigante do setor como o Brasil. Uma nova ninhada de águias surge: as águias agroenergéticas. Irão querer como habitat a Amazônia brasileira em parte ou no todo.


[1] O Brasil está utilizando-se do discurso do aquecimento global para a venda de biocombustíveis, sobretudo nesse momento o etanol. Para nós é uma faca de dois gumes. Até que ponto ela cortará para o nosso lado é uma incógnita. Acreditamos que o melhor caminho seria trabalhar no discurso de que temos um combustível baseado numa fonte ilimitada de energia, o Sol, e que dada nossa posição geográfica e nossa característica territorial de unidade quase continental, possuímos a grande área contínua planetária para produzir biocarburantes.

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